Skip to content
Experiências exitosas
Desenvolvimento de refeições escolares com plantas alimentícias não convencionais (PANC) em Teutônia – RS

Lisangela Bagatini: “Esta pesquisa foi desenvolvida durante meu mestrado em Ciencia e Tecnologia de Alimentos, no Programa de Pós Graduação de Ciência e Tecnologia de Alimentos (PPGTA) da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS). O estudo teve como orientadoraes a Prof. Dr. Elaine Biondo e o Prof Dr. Voltaire Sant’anna, em cooperação com o Instituto Norueguês de Pesquisa em Alimentos, Pesca e Aquicultura. Envolvendo crianças no desenvolvimento de refeições escolares com plantas alimentícias não convencionais (PANC) Autora: Lisangela Bagatini – Nutricionista RT alimentação escolar de Teutônia (RS) CRN2 3759.”

O ambiente escolar é ideal para promover saudabilidade, tendo em vista que alcança a maioria das crianças e adolescentes durante as duas primeiras décadas de suas vidas, e essa característica o torna um local único para desenvolver e aplicar ações com impacto significativo. O envolvimento de crianças na criação de suas próprias refeições tem se mostrado uma estratégia promissora para engajá-las em hábitos alimentares saudáveis e sustentáveis. Diante disso, um estudo com objetivo central de investigar a eficácia do envolvimento de crianças na cocriação de preparações culinárias para o ambiente escolar, com foco na integração de plantas alimentícias não convencionais (PANC), foi desenvolvido nas escolas da rede municipal de ensino de Teutônia, RS, ao longo do ano de 2024. Adicionalmente, buscou-se avaliar a capacidade desses participantes em propor preparações culinárias a partir de tais ingredientes e identificar os principais veículos alimentares para a sua incorporação ao cardápio escolar. Investigou-se ainda, se a participação ativa de um grupo de estudantes no processo de cocriação seria suficiente para catalisar a aceitação por parte de outros estudantes na mesma instituição educacional. Quatro hipóteses foram sugeridas: as crianças preferem adicionar PANC em alimentos familiares e saborosos como veículos alimentares para as refeições escolares; as crianças usam alegações saudáveis e sustentáveis para promover os produtos que oferecem para as refeições escolares; existe uma influência significativa na aceitação e nas emoções evocadas pelas crianças quando elas são estimuladas a consumir uma refeição proposta por elas, em comparação com a informação de que a refeição foi proposta pelas cozinheiras da escola e, não há diferenças na aceitação e nas respostas emocionais entre crianças envolvidas na cocriação de refeições adicionadas de PANC, e aquelas que não participaram do processo. A metodologia empregada estruturou-se em duas fases distintas: a cocriação de preparações enriquecidas com PANC e a subsequente avaliação da aceitação e das respostas emocionais evocadas pelas crianças durante o consumo das receitas desenvolvidas, considerando que no Brasil, o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) exige a análise sensorial de novos alimentos ou ingredientes pelas crianças antes de sua inclusão no cardápio. O processo de cocriação envolveu 57 crianças, com idades entre 10 e 15 anos, provenientes de duas escolas. Foi conduzida por meio de uma abordagem de gamificação na qual a participação ocorreu de forma voluntária. Este processo desdobrou-se em quatro etapas sequenciais: exploração, prototipagem, refinamento e validação. De forma resumida, durante a exploração, algumas PANC foram apresentadas aos escolares através dos cinco sentidos (inhame, ora-pro-nóbis, capuchinha, açaí juçara, açafrão-da-terra e biomassa de banana verde). Elas foram selecionadas com base em estudos científicos que sugeriam espécies seguras para o cultivo e consumo por crianças, além do seu valor nutricional, sua disponibilidade nos mercados locais e produção por agricultores familiares da região. Na etapa de prototipagem, em grupos, as crianças foram desafiadas a criar produtos alimentícios para uma das refeições escolares, seguindo regras específicas. Deveriam optar por uma ou duas ideias dentre as que propuseram, listar os ingredientes, dar um nome ao produto e criar uma frase como estratégia de marketing. Estas receitas originais foram preparadas na etapa seguinte, o refinamento. Trabalhando em colaboração com um dos pesquisadores e as cozinheiras escolares, os estudantes tiveram a oportunidade de degustar suas criações. Esse processo permitiu que as crianças ajustassem ou modificassem suas ideias iniciais, visando a otimização do resultado final, conforme suas próprias percepções. Mantendo a composição original dos grupos, os alunos ainda participaram de uma oficina que consistiu na elaboração de pôsteres virtuais para divulgar as preparações culinárias preferidas de cada grupo aos demais estudantes da escola. Isso permitiu a participação de 180 estudantes do ensino fundamental na votação e identificação da receita que se destacava pela criatividade e pelo apelo sensorial para inclusão no cardápio da alimentação escolar. Dois produtos finais de cada escola foram desenvolvidos usando as ideias propostas pelas crianças com base no produto mais votado (pizza com ora-pro-nóbis e açafrão da terra, e pão de queijo com açaí juçara). Para avaliar o impacto da cocriação na aceitação e nas emoções evocadas, um novo grupo de alunos foi convidado para participar da análise sensorial. De um total de 90 alunos, 83 aceitaram participar desta estapa. Para cada amostra, foi solicitado que as crianças avaliassem sua aceitação utilizando uma escala hedônica facial estruturada de 7 pontos. As crianças também foram solicitadas a assinalar todas as emoções que sentiram em relação a cada amostra, através de emojis. Os resultados obtidos indicaram que as hipóteses 1 e 4 foram confirmadas, e as hipóteses 2 e 3 foram rejeitadas, ou seja, as crianças preferiram adicionar PANC em alimentos familiares e saborosos como veículos alimentares para as refeições escolares; a maioria das crianças preferiu usar a curiosidade em vez de pistas de saúde ou sustentabilidade como estratégias de marketing para seus produtos; a informação de que o produto foi produzido por elas em vez de produzido pelos cozinheiros da escola não alterou a aceitação; já o índice de aceitação das novas preparações foi maior entre as crianças envolvidas no processo de cocriação, do que entre aquelas que não participaram. Esta pesquisa demonstrou, entre outras coisas, que a participação de crianças na cocriação de alimentos destinados à alimentação escolar pode promover um aumento na aceitação emocional, concomitantemente a intensificação do senso de propriedade, familiaridade e orgulho em relação ao produto final. Iniciativas colaborativas bem planejadas, em ambientes escolares, podem aumentar o sentimento de pertencimento, adesão e sucesso, engajando os participantes no tema e promovendo mudança de hábitos. Ao participarem do desenvolvimento de receitas que possam ser acrescentadas aos cardápios escolares, estudantes estão garantindo que as opções saudáveis atendam aos seus gostos.